14 outubro 2005

Processo Penal e interrogação


Apresentada a minha família e excêntricos afins irei só proferir algumas miseráveis frases sobre o julgamento em processo penal. A minha intenção ao não citar artigos ou questões doutrinárias é dupla: não esconder a ignorância sobre as coisas e não maçar eventuais leitores não justos do meu blogue. Além do mais o alzheimer começa a atacar o meu mirrado cérebro.
Num julgamento não pode haver dúvidas que quem se encontra numa situação mais frágil é o arguido. Muitos podem sofrer no e por causa do julgamento (vítimas, testemunhas e os tão mal denominados operadores judiciários nas palavras excentricas de alguém); mas é sobre o arguido que pode recair uma pesada pena tantas vezes privativa da liberdade. Por isso, apesar de tudo, ainda assim, a mentira dita pelo arguido não deve ser sancionada e muito menos com a imposição de um novo crime. Mas se ao contrário da testemunha que mente o arguido não deve ser sujeito a um crime de falsas declarações, um tribunal tem que poder valorar, quando disso não houver dúvidas, a mentira do arguido. A mentira só prejudica, causa confusão e pode levar ao erro judiciário. Como se pode defender, pelo menos teoricamente, que não se pode valorar a defesa apresentada pelo arguido, seja por que mentiu, seja por que colaborou, com excepção da confissão que tem consequências legalmente previstas sem se pensar na injustiça que tal provoca? Um arguido que mente não pode ser alvo de pena igual àquele que desde logo disse a verdade. As pessoas não operadoras do júdice (ou operadoras judiciárias) não podem perceber isto. Note-se que há que respeitar a lei e por vezes lê-se em sentenças que se valora a favor do arguido o ter colaborado para a descoberta da verdade em casos em que não confessou. Penso que tal não é possível actualmente pois o arguido pode adoptar a estratégia de defesa que bem entender sem ter qualquer tipo de sanção ou benefício.
E valorar depoimentos de co-arguidos em relação à actuação de outros co-arguidos? Penso que a lei e o entendimento mais amplo que se tem da mesma se deve manter ou seja, pode valorar-se mas com muitas cautelas, ou seja, se houver apenas em termos de prova um dedo apontado de um arguido a outro, muito dificilmente o tribunal pode ter a certeza que o que fala a verdade é o que aponta e não o apontado. Mas se houver alguns outros elementos de prova que conjugando com tais declarações permitam ao tribunal concluir que o apontado é culpado, deve poder valorar-se.
O julgamento em si tem algumas ideias teoricamente boas (as perguntas serem feitas por intermédio do juiz por forma a evitar a pressão sobre o arguido) mas que na prática já está caducada pelo menos na maioria dos crimes que são julgados em 1ª instância (e não instância e meia como no Círculo). Acaba por se tornar repetitivo, inútil pois o arguido quando ouve da primeira vez já está a responder, limitando-se o juiz a dizer «Ouviu?». Só quando tal pressão começasse a ser notada, é que o juiz deveria intervir limitando a interpelação directa.
Depois são os problemas que já tratei em anteriores posts e que se relacionam com a valoração da prova já produzida em inquérito. Nos crimes mais simples - injúrias, que não devia, na maior parte das situações, chegar a tribunal para julgamento-, ofensas corporais -, a sentença teria de ser na parte do direito, quando nenhuma questão relevante houvesse que tratar, muito simples, limitando-se a indicar o tipo legal preenchido e a pena. No mais, a eliminação de relatórios (e aqui, como em cível, já vi vários julgamentos anulados por que não se resumiu o que o arguido alegou na contestação o que é arcaico (como eu) neste século XXI.
Todos os julgamentos eram gravados pelo que qualquer recurso a incidir sobre prova teria que ser transcrita pelas partes com recurso a determinadas instituições previamente determinadas pelo Ministério da Justiça ou sob compromisso de honra de que tais transcrições correspondem à realidade.
No resto, existem situações que sempre serão dificeis de resolver - arguidos julgados na ausência, sua necessidade de notificação - que no actual sistema me parece dos menos maus.
Algumas notas que antecedem um julgamento: interrogatórios de arguidos presos e instruções sempre que possível devem ser realizadas no gabinete do juiz e não na sala de audiência. É que nesta fazem-se julgamentos e nas pessoas que não são operadoras judiciárias por vezes entendem que já foram julgadas. Não usar nessas diligências beca - máximo de formalidade que só na audiência se deve vestir -.
E já agora, os jurados. o processo de Portimão tem-se falado juventude e participação activa dos mesmos. Em relação à primeira eu, como sócio nº 2 da Liga de Amigos da Padeira de Aljubarrota (a primeira faleceu há cerca de 100 anos vítima de crise de reumático fulminante) penso que alguma maturidae é necesária e talvez 21 anos seja excessivo, por muita personalidade bem formada que se tenha. Nessa idade não se pode perceber bem o que é prender alguém por 25 anos (mas percebe-se um homicídio, é certo). Mas também é certo que tal juventude afasta a pessoa dos vícios da velhice e experência d eviad como seja o ter-se embrenhado na situação que ocorreu, lendo avidamente jornais e visto reportagens sobre o facto pois aos 21 anos os jovens querm é beber um pirolito. Ah? Já não há disso? Bolas, e ninguém me avisou. Bem, querem ir à boite. E isso pode ser uma vantagem, não estar presa a determinados vícios, vantagem essa precisamente avançada para a juventude de juízes que até há pouco tempo saía do CEJ e ainda assim com cerca de 26 anos. Cabe aos advogados rejeitar a inexperiência de um jurado não o seleccionando pelo que ainda assim há que confiar na escolha que foi feita. Agora, das duas uma: ou os jurados decidem se é culpado ou não e o juiz aplica a pena ou então participam na votação da matéria de facto com os juízes mas não participam na pena. Esta é um trabalho técnico, resevado para os técnicos judiciários. Não faz sentido um juiz com 20 anos de carreira discutr (no bom sentido) com uma jovem de 20 anos se o arguido deve ter 20 anos de prisão ou se uma pena deve ser suspensa na execução. O povo participa no julgamento ao votar na culpabilidade; depois, o tribunal original que aplique a sanção. Não me parece justo o sistema actual.
Um abraço ao Dr. Marinho que comparou o Mº. Pº. do processo da Joana a Pôncio Pilatos («não lhe encontro qualquer maldade» ) por ter pedido a interveção de tribunal de júri me assim lavar as mãos. É assaz preocupante este argumento pois existem inúmeros outros processos em que é a defesa que o pede e além do mais para quem defende sempre que os juízes só actuam em nome do povo, criticar quando o povo intervém directamente é de uma coluna vertebral muito elástica.
Por fim, um jurado não deve poder fazer perguntas directamente. Aqui seim, não tem claramenet preparação para o fazer (e o mesmo nos juízes sociais dos menores). a própria forma de perguntar é em 99% errada , muito pessoal. Se há perguntas a fazer e se o podem, então é através do juiz presidente sem excepção.
Tenho visto um blogue com um diário de um juiz. A vida de um juiz num tribunal supõe-se de seca - gabinete a despachar processo e audiência na maior parte das vezes com processos sem interesse -. E já se nota um pouco disso pois sabemos que bebe café e fuma e que tem montes de processos, comendo sopa de vez em quando. Por isso, talvez crie um diário de uma juíza imaginária, comme il faut. Talvez «Le jour de la Belle».
E agora, a interrogação: ninguém gosta do meu conto? Nem para dizer mal? O machado do corte do conto já vai a cair. Por isso, se alguém quiser dizer algo diga. Tenho farturas quentes para distribuir pelos comentadores.

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